[Pe. Alfredinho] Os Errantes da terra

Se saio ao campo, eis os mortos à espada;

se entro na cidade, eis as vítimas da fome;

até o profeta e o sacerdote erram pela terra,

sem saber o que fazer (Jr. 14, 18)!…

No campo, eis a fome junto à safra recorde de grãos e carne;

na cidade, eis as lonas onde se abriga o povo em situação de rua;

até mesmo as autoridades políticas e civis, militares e religiosas

andam errantes, alheias, aturdidas, perplexas, indiferentes!…

Se me dirijo à feira ou açougue, padaria ou supermercado,

cresce o preço, enquanto decresce o volume das compras;

se caminho pelas ruas, eis jovens e adultos sem emprego;

nas praças, longas filas para as marmitas “quentinhas”!…

Pelas latas de lixo, alguém aparece para garimpar comida;

na Igreja, a cada hora aumenta a fila pelas cestas básicas;

no semáforo, um homem implora para vender mercadoria;

no centro, uma mulher oferece o corpo quase desnudo!…

Se visito os limites dos países, o novo coronavírus se alastra;

nos hospitais, sinto a disputa pelos leitos de enfermaria e UTI;

de casa em casa, ouve-se pranto, penas e pêsames da pandemia,

regadas com as lágrimas e lamentações das famílias enlutadas!…

Se percorro as estradas, cruzo com multidões em fuga;

nas fronteiras, pressionam muros visíveis ou invisíveis;

e se examino o rosto das crianças desacompanhados,

escapam da violência e da guerra, da miséria e da fome!…

Os albergues e campos de refugiados se enchem de órfãos:

de pais, de família e de carinho, de pátria e de cidadania,

aves de arribação, atrás de um galho onde pousar/repousar;

juntando cacos para refazer sonhos interrompidos!…

Na capital Brasília, poder e riqueza andam de mãos dadas,

vejo descaso, deboche e desmonte das políticas públicas;

aquilo que aflige, atormenta e dizima a população aos milhares,

acaba menosprezado como “gripezinha”, coisa de “maricas”!…

Se tomo em mãos o globo, quantos forasteiros sem pátria;

se pergunto de onde vêm e para onde vão, dizem que acampam;

sem endereço fixo, sobrevivem no rumor urbano do anonimato;

travessia em busca de migalhas, batidos pelos ventos do capital!…

Se mesclo dados e números, imagino nomes, rostos e histórias;

se traço o mapa das rotas, estas se cruzam e recruzam sem fim;

se tento descortinar seus caminhos, projetos e objetivos,

encolhem os ombros, como quem perdeu âncora e bússola,

tentando às cegas dirigir a embarcação para um porto seguro!…

 

Pe. Alfredo J. Gonçalves, cs, vice-presidente do SPM 

São Paulo, 4 de maio de 2021.

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