[Pe. Alfredinho] A Caravana de Jesus

Além do grupo dos doze apóstolos, embrião das futuras comunidades cristãos que haverão de formar a Igreja primitiva, a caravana de Jesus é também formada por vários outros seguidores, homens e mulheres, discípulos e discípulas. Ao fazer um resumo das atividades do Nazareno, diz o evangelista que sua caravana “percorria todas as cidades e povoados, ensinando em suas sinagogas, pregando a Boa Notícia do Reino, e curando todo tipo de doença e enfermidade. Vendo as multidões, Jesus teve compaixão, porque estavam cansadas e abatidas, como ovelhas que não tem pastor” (Mt 9, 25-38).

Quem são essas “multidões cansadas e abatidas”, com quem tropeça seguidamente a caravana de Jesus? Não é difícil imaginar o aglomerado de rostos e corpos desfigurados: pobres, doentes, pecadores, excluídos e marginalizados – todos em busca de um olhar, um toque, uma palavra de conforto, um encontro que transformasse para sempre suas vidas. Pessoas como o pobre homem assaltado, na parábola do Bom Samaritano. Resulta “caído quase morto” à beira da estrada e da vida. Tampouco será difícil verificar suas chagas, feridas e cicatrizes mal curadas, no corpo, na mente e na alma. Gente que a sociedade e a religião rejeitavam, mantendo-a a boa distância. Predominava a tríplice maldição: se é pobre é porque é doente, e doente porque é pecador. A condição de pobre, doente e pecador era motivo de rechaço e abandono, pois significava uma prova de que que tinha sido abandonado por Deus. São justamente esses que, sozinhos ou aos grupos, buscam o Mestre para encontrar a si mesmo e a Deus. 

A caravana de Jesus percorria cidades e povoados. Não imitava os sacerdotes ou doutores da lei. As pessoas notavam n’Ele um Mestre diferente, por duas razões: primeiro, não permanecia no templo à espera que os fiéis o procurassem para orientá-los; segundo, ao contrário de outros, “falava como quem tem autoridade”. Esta expressão denota, particularmente, aquele que é capaz de falar ao coração das pessoas. E somente o faz, por um lado, quem mantém os ouvidos atentos às dores e penas, sonhos e esperanças do povo; e por outro, quem cultiva uma grande intimidade com Deus – fazendo com isso uma ponte de ida-e-volta entre as preces e anseios do povo, numa margem, e a graça e luz do Pai, na outra. Jesus caminhava como um “profeta itinerante” pelas estradas da Galileia, da Samaria e da Judeia, até chegar a Jerusalém. Nos caminhos, vai abrindo “poços” de encontro com as pessoas necessitadas. Esse é seu método de evangelização. O poço nas encruzilhadas é o símbolo onde sede e água se encontram, interagem, e se complementam. Evangelizar consiste em uma via de mão dupla. À margem do poço, a carência e a abundância se dão as mãos e as pessoas, povos e culturas se enriquecem reciprocamente.

O que faz Jesus diante de tanta dor e sofrimento? Sua caravana jamais atropela aquele que grita por socorro. Os casos são numerosos: o cego de nascimento, que se dirige ao nazareno pedindo piedade; a viúva desolada, que perdera seu único filho; os dez leprosos, que pedem e obtêm a cura; a mulher que há doze sofria de fluxo de sangue, tocando nas vestes do Mestre para curar-se; a sírio-fenícia, que insiste sobre as migalhas atiradas “aos cachorrinhos”; a samaritana que vai buscar água ao poço, encontra Jesus, e se torna missionária; a mulher que foi surpreendida em adultério, e pela lei deve ser apedrejada!… 

A caravana sempre se detém. Os seguidores do Mestre se intrometem para calar o clamor de quem sofre. Mas a delicadeza do homem de Nazaré se revela de forma extraordinária. “Alguém me toucou”! Alguém mais necessitada que os integrantes de sua caravana. Jesus não se contenta em criar uma espécie de fã clube e dele receber aplausos e louvores. Procura dirigir sua atenção e sensibilidade para fora do grupo de apóstolos e discípulos. Revela-se solidário para com os que sequer têm voz para gritar, que não têm pernas para alcançar a água da piscina, ou que se sentem envergonhados pelo julgamento público. Da periferia onde foram deixados, o Nazareno os traz para o centro do palco, tornando-os sujeitos e protagonistas de um novo destino.

Pe. Alfredo J. Gonçalves, cs, vice-presidente do SPM – 10 de agosto de 2021.

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