QUE FAZER DA VIDA?

Talvez seja essa a mais crucial e inquietante preocupação da juventude contemporânea. A questão pressupõe uma reflexão urgente sobre a pergunta fundamental de cada ser humano. Essa pergunta, em última instância, nos leva ao sentido vital da nossa existência sobre a face da terra. Todos e todas, desde o nascimento até a morte, nos debatemos com tal interrogação. Do berço ao túmulo, implícita ou explicitamente, carregamos essa inquietude. Em termos normais, ela permanece latente na trajetória pessoal, sem oferecer maiores problemas. Entretanto, em momentos de crise e de desintegração, a pergunta fundamental emerge com a força de um vulcão. Ou seja, quando o tecido social se rasga e se esgarça, a questão adquire a forma de espinho cravado na alma. Poder-se-ia dizer então que, embora o corpo mantenha a aparência de perfeita saúde, a vida dói. Viver é sofrer. Cedo ou tarde, semelhante dor invisível caba sendo somatizada, manifestando-se de forma física e visível.

Ocorre que, na sociedade atual, vem crescendo sempre mais o número dos jovens “nem, nem”, que não trabalham, e tampouco estudam. Por uma parte, com a progressiva precarização das relações de trabalho, o emprego estável se torna um luxo de poucos. Por outra, o estudo é cada vez menos uma via segura para o mercado de trabalho. Cresce a olhos vistos o número de jovens que, recém-formados, não conseguem um posto para o qual a escola e a academia os preparou. Terminam por alternar uma série de serviços que nada tem a ver com a formação e o diploma. Passam a viver de bicos instáveis, sempre temporários e provisórios. Em lugar de trazer sentido, satisfação e realização, o trabalho torna-se um peso tedioso que, por exemplo, nada exige à potencial criatividade. Isso sem falar que tais serviços efêmeros e precários raramente cobrem as necessidades essenciais da família. Para sobreviver, em cada núcleo familiar, será necessário o trabalho de dois ou mais membros ativos. Como podemos ver, todo esse contexto desfigura e desestimula tanto o estudo quanto o trabalho propriamente dito.

Disso resulta, nos dias que correm, uma gigantesca disponibilidade de jovens e adolescentes (deixando de lado as crianças) para as veredas mais inóspitas, árduas e potencialmente perigosas da trajetória humana. Tal situação, no dizer do sociólogo alemão Norbert Elias, “gera um vasto campo de recrutamento, não só para os traficantes de drogas atuais, mas também para as futuras guerrilhas urbanas e para os futuros movimentos radicais em geral, de direita ou de esquerda” (ELIAS, Norbert, Os alemães – a luta pelo poder e a evolução do habitatus nos séculos XIX e XX, Jorge Zahar Editor, Rio de Janeiro, 1990, tradução de Álvaro Cabral, pág. 186).

Elias refere-se à realidade da Alemanha na década de 1960, isto é, na esteira do trauma causado pela ascensão e queda do nazismo, com a tragédia da Segunda Guerra Mundial e do holocausto. No caso do Brasil (e não só), haveria de acrescentar o recrutamento dos jovens, via redes sociais, por parte da extrema-direita, como também o surgimento de grupos intolerantes, seja no campo da religião, da política ou da ideologia. E como alerta o autor citado, o tráfico e consumo de drogas e as “cracolândias” se espalham como erva daninha pelo território brasileiro. Sem esquecer o drama da prostituição precoce, combinado com o tráfico de jovens, meninos e meninas, em geral para fins de exploração sexual e/ou trabalhista.

Que outra luz podemos descortinar no túnel escuro da juventude? Onde buscar o significado profundo da existência? Que lhes podem dizer a geração que os pôs no mundo? Nesse vazio existencial e na falta de vias alternativas, engendram-se as bolhas intransigentes na religião, as tribos urbanas das torcidas organizadas, o acesso complexo à droga, às armas e ao crime, a polarização ideológica da política, o isolamento solitário e depressivo e, de maneira toda particular, a posse doentia da pessoa amada, o que facilmente acaba em feminicídio. Chamado a ser “o futuro da sociedade”, como uma espécie de herói nacional, o jovem vê-se enroscado nas malhas dos oportunistas de plantão, numa rede nociva que, irremediavelmente, o acorrenta à mediocridade de um cotidiano sem sabor, à criminosa “opção” por caminhos turbulentos e tortuosos, com o risco permanente da prisão ou da morte. A escolha torna-se bem estreita: virar assassino ou “presunto”.

Juventude filha da crise, do desemprego, subemprego ou trabalho informal. Órfã de referências sólidas, de valores positivos e de largo horizonte. Rapazes e moças, adolescentes de ambos os sexos, meninos e meninas – à deriva! Não há bússola, não há leme, não há âncora, não há farol, não há porto seguro. Estudar e trabalhar converteram-se em coisas enfadonhas e inúteis. Onde encontrar regras e limites? A família, a escola, a academia, a amizade e a igreja parecem despreparadas para esse vazio existencial. O Estado, por sua vez, quando chama a atenção para a disciplina, o faz com a violência. De fato, se a polícia entra em cena, é porque o leite já derramou. Tarde demais! Em aberto, permanece o imenso desafio: como resgatar nas crianças, adolescentes e jovens a confiança em si mesmos e nas instituições sociais!?… Mantém-se acesa a chama da esperança, mas onde estão as iniciativas!?…

Pe. Alfredo J. Gonçalves, cs, assessor do SPM, São Paulo/SP, 22/05/2025

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