Educar para a Interculturalidade: um novo marco para as migrações no Brasil
O Decreto nº 12.657/2025 inaugura uma política migratória humanista, participativa e comprometida com a educação inclusiva
Por Gilvanda Soares Torres
Fortaleza – Ceará, 2025
O Brasil dá um passo histórico com a promulgação do Decreto nº 12.657/2025, que institui a Política Nacional de Migrações, Refúgio e Apatridia (PNMRA). A nova política representa um avanço civilizatório ao consolidar uma visão humanista e intercultural sobre o fenômeno migratório, fundamentada na proteção de direitos, na integração social e na valorização da diversidade cultural.
Desenvolvida de forma interministerial e participativa, a PNMRA busca garantir acolhimento, inclusão e protagonismo à população migrante, superando práticas assistencialistas e fragmentadas. Entre seus principais avanços estão o fortalecimento da integração local, com maior protagonismo de Estados e Municípios; o reconhecimento dos migrantes como agentes de desenvolvimento social e econômico; e a criação de planos de contingência e respostas humanitárias para situações de crise.
O decreto também prevê a inclusão de migrantes no Cadastro Único, ampliando o acesso a políticas públicas nas áreas de trabalho, educação, saúde e assistência social. As regras para vistos e autorizações de residência foram modernizadas, tornando os processos mais ágeis e fortalecendo os mecanismos de acolhida humanitária. Além disso, a criação do Plano Nacional de Migrações, Refúgio e Apatridia, com metas quadrienais, garante a continuidade e o monitoramento das ações.
Em minha pesquisa de mestrado no Programa Interdisciplinar em Humanidades da UNILAB, investiguei a inserção intercultural de crianças e jovens imigrantes nas escolas públicas de Maracanaú (CE). A presença desses estudantes tem gerado novos desafios pedagógicos e oportunidades de aprendizagem mútua, exigindo das escolas respostas planejadas, dialógicas e culturalmente sensíveis.
O artigo 12 do decreto atribui ao Ministério da Educação (MEC) um papel central nesse processo, com ações voltadas à educação intercultural e bilíngue, à produção de materiais didáticos multilíngues e à oferta de português como língua de acolhimento — substituindo a lógica assimilacionista do ‘português como segunda língua’.
Essas medidas traduzem um princípio essencial da interculturalidade crítica, defendida por autoras como Vera Maria Candau (2016) e Stuart Hall (2003): a educação deve promover o diálogo entre culturas, combater o racismo e a xenofobia, e reconhecer a diversidade como um ativo social e pedagógico.
As conclusões da minha pesquisa confirmam que a matrícula de estudantes migrantes não é suficiente para garantir inclusão. É preciso compreender a escola como espaço de pertencimento e reconhecimento, onde o processo educativo se articula com políticas sociais que assegurem moradia, alimentação e proteção.
O decreto reforça essa visão ao propor a formação inicial e continuada de professores com enfoque intercultural, estimulando licenciaturas e programas voltados à diversidade cultural e linguística. Assim, rompe-se com o multiculturalismo superficial — limitado a datas comemorativas — e promove-se uma pedagogia crítica e decolonial, capaz de enfrentar desigualdades e ampliar a justiça cognitiva.
Outro ponto inovador da nova política é a criação do Fórum Nacional de Lideranças Migrantes, Refugiadas e Apátridas (FOMIGRA), que garante participação direta dos migrantes na formulação e monitoramento das políticas públicas. Essa proposta estabelece uma governança intercultural, em que os migrantes deixam de ser vistos apenas como beneficiários e passam a atuar como coprodutores das políticas que os afetam.
O Decreto nº 12.657/2025 inaugura um novo paradigma de cidadania e convivência democrática. No campo educacional, oferece base normativa para a construção de escolas públicas acolhedoras, plurilíngues e inclusivas, comprometidas com a formação cidadã e o respeito à diferença.
Mais do que um marco legal, a PNMRA expressa um compromisso ético e político: educar para a interculturalidade é educar para a democracia e para a cidadania global, reafirmando o papel da escola como espaço de transformação social, diálogo e justiça.
Gilvanda Soares Torres é professora da rede pública de Maracanaú, pesquisadora do Mestrado Interdisciplinar em Humanidades da UNILAB e vice-tesoureira nacional do Serviço Pastoral do Migrante (SPM). Desenvolve estudos sobre interculturalidade, migração e educação.


Este decreto parece promissor, mas só me faz rir ao pensar que vão ter que inventar um curso de Português para Interculturalmente Insensíveis para os professores. Acho que o desafio mais difícil será modernizar os vistos para que eles passem mais rápido do que meu pedido de leave. Quem diria que incluir migrantes no Cadastro Único seria tão complicado quanto tentar entender o menu no restaurante da frente. O Fórum Nacional de Lideranças Migrantes é uma ideia genial, mas já me imaginei explicando aos meus alunos como funciona a governança intercultural – acho que vai ser um desafio pedagógico ainda maior que a aprendizagem de português!free ai watermark remover